domingo, 3 de junho de 2012


Há um leitor em cada
esquina
À espreita.

É preciso estar atento.

Rapidamente
escondo o poema
dentro da bolsa
e aperto-a contra o corpo.
Observo.

É preciso ter cuidado.

Há um leitor em cada
esquina
À espera.

Sorrateiramente
confiro o poema.
(Ele ainda está
na bolsa)
Alívio.

É preciso não fazer barulho.

Há um leitor em cada
esquina
- e se eu caio em desleixo -
o poema é roubado
e revelado:

versos
que não passam de alguns
rabiscos de criança.

Até que o poema acabe

Estaremos juntos
em juras de amor
corpos entrelaçados
beijos intermináveis.
Juntos
no possível e
no impossível
e na sede insaciável
de sermos
a dois.
Juntos
no desejo incontrolável,
na troca de olhares,
na trama profunda.

Estaremos juntos,
até que o poema acabe...



Acabou.

sexta-feira, 1 de junho de 2012

Canção para despertar



Levantemo-nos, é tempo de despertar. O sol cuidou de cochilar até mais tarde para nos garantir a alvorada: despertemos. Acordemos a mulher que dorme no berço de nossos quadris. Acordemos e marchemos, como lobas, em busca do que nos foi roubado. Lutemos, mulheres, pelo direito de querer. Desejemos o mundo; desejemos mais; desejemos sempre. Fantasiemos! Reivindiquemos o direito de enxergar – com os nossos próprios olhos. E reaprendamos, enfim, a ver com os olhos da alma. Gritemos, mulheres, com os nossos ovários. Façamos ecoar as nossas vozes e as nossas canções. Recuperemos o poema. Recuperemos nossa arte: pintemos, dancemos, escrevamos, teçamos. Falemos de nossas cicatrizes em forma de versos, de nossos milagres em forma de quadros, de nossas conquistas em forma de passos. Voltemos a contar histórias. Povoemos o mundo com os nossos mistérios.  Entremos nas cavernas do Feminino, mergulhemos no profundo, no oculto, no vazio. Não temamos a solidão – que não de passa de medo de nós mesmas. Tomemos posse de nossos corpos, reconquistemos o direito de nos amar pela beleza natural que eles sustentam. Saboreemos a doçura de ser o que se é. Encantemo-nos com as nossas estações e envelheçamos honrando o poder dos ciclos. Permitamo-nos, mulheres, reconhecermo-nos umas nas outras.  Deixemos o sangue escorrer por nossas pernas e manchar nossos pés de vermelho. De mãos dadas, brinquemos de colorir o mundo de carmim. Experimentemos amar sem sacrifício e nos sentirmos amadas sem esforço. Resgatemos nosso passado. Escutemos o Feminino milenar, ancestral, universal, que nos une, nos acolhe e nos dota de língua própria. Sejamos, assim, filhas da terra. Deixemos que o mar lave nossas feridas, que o sol as transforme em cicatrizes, que a lua as manche de sentido. Libertemos a nossa intuição – há tanto tempo condenada à tolice. Convoquemos nossa Andarilha, convoquemos a Grande Mãe, a Velha Sábia, a Guardiã, a Bruxa, a Guerreira. Convoquemos a Mulher, silenciada e proibida,   a Mulher, humilhada e torturada, a Mulher enfraquecida. Demos de mamar para essa em nossos braços, revigoremos sua força  e a abençoemos com o poder sobre si mesma. Avante, mulheres do mundo inteiro!