segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Da janela do avião


Eu escreveria um lindo poema
se meus olhos pudessem ver.

Eu escreveria versos
sobre aquelas casinhas de fósforo
tão ao longe...
Mas ficam tontos os meus olhos.

Se os meus olhos pudessem ver,
eu escreveria sobre o mar branco
(de branca dor)
por onde navega este avião.

Escreveria sobre a linha reta
que o homem traça
ensinando geometria aos campos.

Escreveria sobre os olhos de Deus,
mas os meus próprios olhos
não são capazes
de enxergar.

Faria estrofes sobre as cidades
que se expandem
e se espalham,
infinitas.

Escreveria sobre o destino
daqueles carros
que lá embaixo se movem.

E sobre as gentes
que dentro desses carros
sobem e descem as ruas
de suas vidas.

Eu escreveria sobre a loucura
das estrelas
mas não consigo
mirar.

Em tempo, 
já estou em solo outra vez 
e deixo 
o mundo
para um poeta de olhos mais firmes.


domingo, 16 de setembro de 2012

Mais lições para se tornar um poeta

I.

Tenha sempre um lápis à mão...
Para brincar de jogo da velha
enquanto espera a fila do banco.

II.

Nunca revele
com quantos pontos se faz
uma reticência.

(Comece adivinhando porquê não são três.)

III.

Todos os dias,
dê de mamar ao silêncio.

IV.

Desabafe sua dor mais profunda a alguém
que não entende sua língua.

V.

Pegue o livro de palavras eruditas
e ponha
para enfeitar a mesa da sala.


VI.

Um dia na semana
pratique sexo moral
sem abrir a boca.

VII.

Apenas explique um poema
com outro poema.

VIII.

Ame uma formiga.

IX.

Ensine dois princípios
a uma parede,
sob pena de deixá-la de recuperação.

X.

Pelo menos uma vez por mês,
experimente o que é morrer.

quinta-feira, 13 de setembro de 2012

Lições para se tornar um poeta

Acorde bem cedo
Escolha um jardim
e observe
como nasce uma borboleta.

Observe a lagarta
o casulo
e as asas.

(Reflita dois minutos
sobre a contradição entre a morte
da planta
e a vida do bicho)

Surpreenda-se com a cor do animal
que era preto e agora
voa.

Depois seja rejeitado
duas vezes
pela mesma pessoa.

Quando já não suportar sua dor,
pegue um papel
e escreva
qualquer coisa
sobre transformação.

Se você
deixou de lado a borboleta,
está quase pronto
para se tornar um poeta.

E a lição de observar o bicho?
Passar o tempo...

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