Você tem razão em me negar. Em fugir, fechar o vidro do carro para esta pedinte. Você tem razão: estou a pedir, a clamar, a implorar, a insistir - um pouquinho, só um pouquinho de amor, que você queira tirar rapidamente da carteira e jogar pela fresta do vidro enquanto o sinal ainda abre. Uma esmola, um pedaço de carinho, um olhar amassado, o final de um sorriso, o que sobrou de um abraço... Qualquer coisa assim, enquanto puxo a barra de sua calça e lhe obrigo a me ver, com a alma exposta, suja e cheia de feridas.
Você tem razão em recuar assustado, sumir de repente, sem saber ao certo porquê se afasta, mas atendendo a isso que lhe chama a me deixar. Você tem razão em não me acompanhar, porque meu buraco me engole - e lhe engoliria também. Eu peço apenas porque aprendi que viver é pedir e não receber. E então eu continuo pelas esquinas, mendiga da alma, a invadir os espaços, a desejar que me levem. Sempre atrás do que nunca me dão, porque simplesmente não me podem dar o quero. Quero um olhar que me pegue ao colo e, me vendo, possa me salvar do abandono. Mas começo a compreender que ninguém no mundo tem esses olhos: estou abandonada em mim mesma. Eu - sou órfã de mim.
E nada me resta senão continuar a pedir. Pedir, pedir, e me sentir tantas vezes invisível, tantas vezes humilhada, que esgotada, enfim, eu desista da salvação. E assim, quem sabe, talvez eu me encontre por aí, maltrapilha, pequenina, e com frio... E aí, quem sabe, eu me encante por essa menina, e me pegue no colo e possa, finalmente, me entregar a mim mesma; cheia de feridas, mas exigindo viver - e inteira.